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07/09/2015

O nosso cérebro: tão maravilhoso; tão enganador...

Você não toma as próprias decisões e boa parte do que vê não é real. É apenas uma ilusão criada pelo seu cérebro, que passa pelo menos 4 horas por dia enganando você aplicando truques.
Que realmente acontece dentro da mente?
Ele engana. Ele toma decisões irracionais, que vão contra os seus interesses. Você não está no controle da própria mente. Mas não se preocupe: você é normal. Não é maluco e possui um cérebro perfeito, como o de qualquer outra pessoa. Só que ele inventa coisas para iludir você. Não é por mal. É só uma maneira de economizar energia. O cérebro humano é o objeto mais complexo do Universo. Tem 100 bilhões de neurônios, que podem formar 100 trilhões de conexões. Se fosse possível criar um computador com o mesmo número de circuitos do cérebro, ele consumiria uma quantidade absurda de eletricidade: 60 milhões de watts por hora. Mas o cérebro humano gasta pouquíssima energia, 20 watts, menos que uma lâmpada. E mesmo assim consegue fazer coisas extremamente sofisticadas, de que nenhum computador é capaz. Mas isso tem um preço. O seu cérebro não consegue analisar as situações de forma completamente racional, avaliando todas as variáveis envolvidas em cada caso. Para fazer isso, ele precisaria de ainda mais circuitos e muito mais energia. Mas, ao longo da evolução, a natureza encontrou uma solução: o cérebro pode mentir para seu dono. Descartar informações, manipular raciocínios e até inventar coisas que não existem. Dessa forma, é possível simplificar a realidade e reduzir drasticamente o nível de processamento exigido dos neurônios. Tudo começa pela visão. Você não percebe, mas o cérebro edita o que você vê. Das 16 horas por dia que uma pessoa passa acordada, em média, 4 horas são preenchidas por imagens "artificiais" que não foram captadas pelos olhos, e sim criadas pelo cérebro. O olho humano só capta imagens com clareza em uma pequena parte, a fóvea (ou mancha amarela), que tem 1 milímetro de diâmetro e fica no centro da retina. Então, para compor a imagem que você está vendo agora, os seus olhos estão constantemente em movimento. Eles focam determinado ponto e depois pulam para o ponto seguinte. Cada um desses saltos tem duração de 0,2 segundo. O problema é que a cada pulo desses, enquanto os olhos estão se movendo para a próxima posição, o cérebro deixa de receber informação visual por 0,1 segundo. Durante esse tempo, você está cego. E, como nossos olhos fazem pelo menos 150 mil pulos todos os dias, o resultado são 4 horas diárias de cegueira involuntária. Você não percebe isso porque o cérebro preenche esses momentos com imagens artificiais, que dão a sensação de movimento contínuo. Mas que, na prática, você não viu. O que você enxerga não é o que está acontecendo é o que vai acontecer no futuro. Isso acontece porque a informação captada pelos olhos não é processada imediatamente. Ela tem de passar pelo nervo óptico e só depois chega ao cérebro. O processo leva frações de segundo, e você não pode esperar: um atraso na visão pode fazer com que você seja atropelado ao atravessar a rua, por exemplo. Então, o que faz o cérebro? Inventa. Analisa os movimentos de todas as coisas e fabrica uma imagem que não é real, contendo a posição em que cada coisa deverá estar 0,2 segundo no futuro. Você não vê o que está acontecendo agora, e sim uma estimativa do que irá acontecer daqui a 0,2 segundo. De acordo com o psicólogo Daniel Kahneman que ganhou o Prêmio Nobel de Ciências Econômicas por suas pesquisas sobre o comportamento humano, o cérebro tem dois tipos de pensamento. O primeiro é rápido e intuitivo e confia na experiência, na memória e nos sentimentos para tomar decisões. O segundo é lento e analítico e serve como uma espécie de guardião do primeiro. Se o pensamento intuitivo não existisse, seria extremamente difícil escolher uma roupa ou responder a perguntas banais, do tipo "como você está?" ou "gostou do filme?". De certa forma, o pensamento intuitivo é o que nos diferencia dos robôs. E é ele que permite ao cérebro processar informações na velocidade necessária. Ele é mais influente. É o autor secreto de muitas decisões e julgamentos que você faz. Esse duelo entre os dois tipos de pensamento, o rápido-intuitivo e o lento-analítico, também tem uma explicação evolutiva. O córtex pré-frontal, região do cérebro responsável pelo processamento lógico, surgiu relativamente tarde na evolução da espécie humana. Já as emoções e os instintos estavam com nossos ancestrais há muito mais tempo. Por isso elas são tão fortes e nos influenciam tanto. A filosofia considera o ser humano um animal racional, mas é que apenas em certas circunstâncias e à custa de muito esforço conseguimos ser racionais. O pensamento intuitivo está sempre presente, até nas situações em que a racionalidade é supremamente importante. Um estudo de pesquisadores das universidades de Ben Gurion, em Israel, e Columbia, nos EUA, analisou o comportamento de juízes que deveriam decidir sobre a liberdade condicional de presos (um processo rápido, que leva 6 minutos). Em média, somente 35% dos condenados ganhavam a condicional. Mas os cientistas perceberam que os juízes eram muito mais benevolentes depois de comer. Quando eles tinham acabado de fazer uma refeição, a taxa de aprovação subia para 65%. Com o passar do tempo, a fome vinha chegando, e a concessão de liberdade condicional ia caindo. Minutos antes do próximo lanche, o índice de aprovação era quase zero. Decidir sobre liberdade condicional e julgar a própria felicidade são tarefas complexas. Para avaliar todas as variáveis envolvidas, muitas delas subjetivas, o cérebro tenderia a ficar sobrecarregado. Por isso, ele usa atalhos. Os nossos problemas são resolvidos no piloto automático, através de soluções que a cultura já embutiu no nosso cérebro. Estudos têm revelado outra distorção: toda pessoa quase sempre tende ao otimismo, mesmo quando não há motivos para isso. A pesquisadora Tali Sharot, da University College London, gravou a atividade cerebral de voluntários enquanto eles imaginavam situações banais como tirar uma carteira de identidade. Ela também pediu que os voluntários pensassem em coisas do passado. Os testes mostraram que as mesmas estruturas cerebrais são ativadas para recordar o passado e imaginar o futuro. Só que, ao imaginar o futuro, os voluntários criavam cenários magníficos. Era o cérebro tentando colorir os eventos sem graça. Cerca de 80% das pessoas têm tendência ao otimismo, algumas mais do que outras. O otimismo é sempre mais comum que o pessimismo, seja qual for a faixa etária ou o grupo socioeconômico da pessoa. Assim, muitas vezes não acreditamos que algo vá dar errado mesmo quando o mais racional seria pensar que sim. As taxas de divórcio, por exemplo, chegam a 40%, 50%, mas as pessoas que estão para casar sempre estimam suas chances de separação em 0%. Segundo o estudo, a inclinação natural ao otimismo também é um dos fatores que levam as crises econômicas globais. As pessoas acham que os mercados continuam subindo cada vez mais e ignoram as evidências contrárias.
As manipulações criadas pelo cérebro afetam até a capacidade mais essencial do ser humano: tomar as próprias decisões. Quando você decide alguma coisa, na verdade o cérebro já decidiu com uma antecedência que pode chegar a 10 segundos. Uma experiência feita no Centro Bernstein de Neurociência Computacional, em Berlim, comprovou que as nossas escolhas são resolvidas pelo cérebro antes mesmo de chegarem à consciência. Voluntários foram colocados em frente a uma tela na qual era exibida uma seqüência aleatória de letras. O voluntário tinha que escolher uma das letras e apertar um botão sempre que ela aparecesse. Os cientistas monitoraram o cérebro dos participantes durante o experimento. E chegaram a uma descoberta impressionante: 10 segundos antes de os voluntários escolherem uma letra, sinais elétricos correspondentes a essa decisão já apareciam nos córtices frontopolar e medial, as regiões do cérebro ligadas à tomada de decisões. Cinco segundos antes de o voluntário apertar o botão, o cérebro ativava os córtices motores, que controlam os movimentos do corpo. Isso significa que, 10 segundos antes de você fazer conscientemente uma escolha, o seu cérebro já tomou a decisão para você e até já começou a mexer a sua mão. O cérebro restringe previamente as suas possíveis opções e, pior ainda, escolhe uma delas antes mesmo que você se dê conta. É possível lutar contra isso? Sim, com o pensamento lento-analítico. Basta colocá-lo em ação tendo calma, refletindo sobre as coisas e duvidando das suas escolhas e opiniões. Os truques do cérebro são poderosos, mas não invencíveis.
Você é realmente livre para tomar as próprias decisões?


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