Duas perguntas diferentes. A primeira, pergunta
se você está satisfeito com o andamento da sua vida. A segunda, pergunta se
você está feliz neste momento. Somando essas duas coisas, qual é o saldo final?
Feliz ou infeliz? A felicidade é uma
mistura do presente com o passado. Só que o presente dura muito pouco. Para
ser mais exato, 3 segundos.
A cada 3 segundos, ele se torna passado. Essa
ideia surgiu em estudos do psicólogo francês Paul Fraisse e hoje é aceita por diversos pesquisadores. Após 3
segundos, todas as informações que passam pela sua cabeça saem da consciência e
são arquivadas nos sistemas de memória do cérebro. Isso significa que você
enxerga a própria vida, fundamentalmente, através da memória. Na prática, ela é
o fator que mais pesa na felicidade, mas está longe de ser confiável. Quase
sempre nossas lembranças omitem ou distorcem detalhes do que aconteceu.
A ciência está começando a entender como esse
processo acontece. A memória é influenciada por dois mecanismos. O primeiro é a
negligência sobre a duração das nossas experiências, ou seja, um instante de
alegria intensa vale mais do que uma semana de felicidade moderada. E o segundo
é a tendência a atribuir muita importância aos momentos que vêm por último e
isso pode nos levar a julgamentos equivocados.
A memória negligencia a duração dos eventos, e
isso não colabora com nossa preferência por prazeres prolongados e dores
curtas. Isso leva ao primeiro segredo para influenciar a memória: buscar
experiências que rendam muitas lembranças - mesmo que elas não sejam
necessariamente o que você mais deseja fazer. A memória precisa da emoção. A nossa memória não foi desenvolvida
para guardar tudo. Temos a tendência de nos lembrarmos melhor de coisas que têm
colorido emocional. A memória privilegia os momentos em que vivemos as emoções
mais fortes. É um recurso evolutivo.
Por isso ficamos entediados com as
obrigações do dia a dia: a rotina não produz sentimentos intensos. A memória é
refém dos picos de emoção. Por isso, para ser feliz, temos que evitar situações
que possam gerar memórias negativas, mesmo que elas também prometam alguma
recompensa. Um prêmio tende a virar rotina depois de um certo tempo, mas as
frustrações ficam marcadas na memória.
Nossas próprias memórias não são confiáveis. O
simples ato de se lembrar de uma coisa é o suficiente para distorcê-la. Isso
tem uma explicação neurológica. As memórias são armazenadas na forma de
conexões semipermanentes entre neurônios.
Quando você se lembra de alguma coisa, essas conexões se tornam instáveis e
quimicamente sujeitas a modificações e distorções. A cada vez que você acessa
uma memória, ela pode ser alterada. É possível reprogramar lembranças ruins. Quando
utilizamos as nossas memórias, a informação fica suscetível a mudanças, durante
um tempo que pode durar horas. Essa maleabilidade é importantíssima. As
memórias ficam instáveis quando as acessamos justamente para permitir que novas
informações sejam agregadas a elas.
Se a
memória humana fosse 100% imutável, ninguém conseguiria aprender nada.
A readaptação de memórias é um processo natural
que acontece a todo momento sem que você perceba. Não temos total controle
sobre esse mecanismo nem os cientistas estão convictos do nosso poder sobre
ele. Dependemos de uma vida feliz no presente para conviver melhor com os
acontecimentos do passado e para produzir boas lembranças das coisas que
estamos vivendo agora. Mas não serve qualquer tipo de felicidade. É preciso buscar um tipo específico de felicidade, que
dribla as limitações da memória humana. O truque é provocar variações no
cotidiano, o que fará com que ele se enquadre na categoria de eventos
"diferentes" e acabe gravado na memória.
Os hábitos são uma grande oportunidade, porque podemos mudá-los.
Também é fundamental
ter objetivos. Ter
metas é importante porque influencia o presente - e, como o presente só dura 3
segundos, influencia também a memória.
O segundo caminho é encontrar alguma coisa de
que você goste muito, mas muito mesmo. Isso tem uma importância maior do que
parece. Quem sente uma concentração
absoluta, quem não vê o tempo passar diante de uma atividade complicada mas
agradável, vai querer repetir a experiência. As pessoas felizes costumam
relatar a necessidade de repetir com frequência a experiência de "parar o
tempo", um conceito conhecido como "fluxo". O que você atinge é um fluxo, e, quanto mais você
investe nas suas maiores forças, maior o fluxo que você atinge na sua vida. É
como se os benefícios dessas experiências prazerosas irrigassem satisfação para
outras áreas da vida, criando condições para que você estabeleça um fluxo
positivo para produzir memórias mais interessantes sobre o presente e para
reinterpretar recordações do passado. Seja qual for a sua escolha, boas
memórias dependem do contato com essa fluidez. Quando sentimos a felicidade
acontecendo no presente, e não somente no passado.
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